terça-feira, 4 de dezembro de 2012

As crianças passam fome porque os pais têm falta de tempo

Eu costumava contribuir para o Banco Alimentar. A minha mãe fazia-o e eu achava que também o devia fazer.
Até que um dia fui a um supermercado comprar fraldas para a minha filha. Um rapazito espetou-me um saco de plástico na cara. Eu disse que não queria, obrigada, e segui caminho. Estava a passar tempos difíceis e todos os tostões contavam. E o raio do puto começa a insultar-me! Que um dia podia ser eu a passar fome, que nunca pensamos nos outros, blá, blá blá, blá. Quando dei por mim, já tinha dado meia volta e já estava de dedo espetado, praticamente enfiado dentro do nariz do miúdo. Gritei com ele, obviamente. Que sabia ele sobre mim? Depois vem de lá um senhor, pediu muitas desculpas, que o miúdo não sabe o que diz, eu resmunguei mais umas coisas do tipo "e formaçãozinha para os voluntários era capaz de ser boa ideia, não?".
Enfim, fiquei capaz de enfiar o raio do saco cabeça-abaixo do raio do puto!

Neste fim de semana fui às compras com a piolha. E novamente espetaram-me um saco de plástico na cara. Levaram com um "Não, obrigada" e eu levei com os olhares reprovadores dos voluntários.

Entretanto a L. perguntou-me porque estavam a dar-me um saco e eu recusei. Não lhe expliquei porque recusei - prefiro que ela decida no que quer acreditar, sem juízos de valor da sua mãe - mas expliquei-lhe o que era o Banco Alimentar.
Prometi-lhe a moeda do carrinho de supermercado quando estivéssemos despachadas e ela ficou muito pensativa, a tentar decidir se guardava a moeda no mealheiro dela ou se comprava comida para entregar ao Banco Alimentar.

Dei-lhe a moeda, ela passou pelos voluntários e foi dar ao rapaz sem pernas que estava ao frio, lá fora.

E eu fiquei estonteada a assistir à cena. Está uma pessoa, ao frio, com fome, com um ar miserável à porta de um supermercado e há gente a brincar às caridadezinhas. Está um ser humano ao frio, com fome, doente, à porta de um supermercado a assistir a toneladas de alimentos a passarem-lhe à frente da cara... Mas aquilo não é para ele... É para outros pobrezinhos. Se calhar, para pobrezinhos com melhor aspecto.

É tudo muito triste, mas só não vê quem não quer. São os empregados dos supermercados que deitam lixívia para cima dos frangos assados que sobram para não terem pessoas a remexerem-lhes o lixo, são voluntários a gabarem-se de terem arroz para o ano inteiro, para não falar nos lucros que as grandes superfícies têm com estas acções... são histórias infindáveis, cruéis, tristes, desumanas.

Eu não pactuo mais com popotas, idiotas ou bancos alimentares. Isso é desresponsabilizar o Estado da sua função social! E não é isso que vai tirar a fome ninguém... lamento. Mas é a pura das verdades. Para mim não é este o caminho.

E esta Jonet coitadinha... sofre do síndrome da terra da fantasia ou coisa parecida. Ou então é mesmo uma atrasada mental.


Roubado do facebook do Rui Zink.


Entretanto o que me vai dando alento é a L. Ainda não percebe a dimensão da podridão do nosso mundo e para ela tudo tem solução. 

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